Você já parou para pensar sobre a vida? Sobre o trabalho que fazemos, as coisas que conquistamos, o tempo que passa tão rápido? Eclesiastes é um livro bíblico que mergulha fundo nessas questões, oferecendo uma perspectiva honesta e, às vezes, surpreendente sobre a realidade humana. Embora possa parecer um pouco melancólico ou confuso à primeira vista, entendê-lo é fundamental para encontrar a verdadeira sabedoria no dia a dia. Vamos explorar como abordar este livro e desvendar seus ensinamentos.
Quem é Qohélet e Quem Compilou o Livro?
O livro de Eclesiastes chega até nós por meio de um editor, que compilou os ensinamentos e provérbios de um sábio mestre israelita. Este mestre se autodenomina Qohélet, um título que pode significar “aquele que reúne” e alude ao seu papel como mestre de sabedoria em uma assembleia. Embora propositadamente mantido anônimo, ele é identificado como um rei davídico. O editor, cuja voz é ouvida no início (1:1,2) e no fim (12:9-14), ressalta o valor dos argumentos de Qohélet, mas também apresenta sua própria perspectiva final.
O Conceito Central: Hebel
Desde o prólogo, Qohélet estabelece a preocupação básica que conduz todo o livro: a natureza hebel da vida humana. A palavra hebel é traduzida na Nova Versão Internacional (NVI) como “inutilidade”, mas pode ser melhor compreendida literalmente como “sopro” ou “vapor”. A ideia é que, sob o sol, tudo o que é humano parece transitório, sem permanência ou novidade duradoura. Pessoas vêm e vão, mas a terra permanece.
Essa é a lente pela qual Qohélet examina a labuta humana, a riqueza, a sabedoria e outras buscas. Ele pondera sobre o que se ganha ao alcançá-las quando, no fim, a morte chama a todos – ricos e pobres, sábios e tolos. A realidade parece ser a mesma antes e depois da existência de qualquer pessoa.
Por que Eclesiastes Parece Difícil (e Como Superar Isso)
Tradicionalmente, Eclesiastes é considerado um livro difícil de ler. As fontes apontam alguns motivos:
- A natureza um tanto desconexa de muitas observações de Qohélet para a mente ocidental.
- Algumas declarações surpreendentemente antitéticas (que parecem opostas) no mesmo livro.
- O lado negativo de algumas declarações, que podem parecer contradizer o restante da Bíblia.
No entanto, para uma boa leitura, é crucial tentar ler o livro sob a perspectiva do editor-compilador. O editor era um mestre da sabedoria que, vivendo antes da plena revelação da ressurreição, reconheceu o valor da afirmação de Qohélet de que a vida neste mundo nem sempre faz sentido. Entender o(s) contexto(s) de Qohélet é crucial. Ao fazer isso, você pode enxergar que a mensagem final do livro não é hedonista ou fatalista.
A Estrutura e Como Abordá-la
A estrutura de Eclesiastes pode não apresentar uma ordem imediatamente aparente. No entanto, o autor apresenta e reproduz certos temas, seguindo na direção de um conselho conclusivo.
Uma forma de entender a estrutura, com base na fonte, é:
- Prólogo (1:1-11): Introduz o título e os temas principais do livro. Estabelece a preocupação básica de Qohélet sobre a natureza hebel da vida e a questão sobre o proveito da labuta humana.
- As Palavras de Qohélet (1:12 a 12:7): Esta é a parte principal. Pode ser vista em duas subdivisões coerentes:
- 1:12 a 6:12: Expondo e repetindo as principais preocupações de Qohélet.
- 7:1 a 12:7: Mantendo os temas vivos, mas soando muito mais como sabedoria proverbial7. Dentro dessa seção, há um movimento em direção ao conselho conclusivo aos jovens (11:9 a 12:7): desfrutar a vida enquanto são jovens, mas lembrar-se de seu Criador ao fazê-lo.
- Epílogo (12:8-14): As palavras do próprio Qohélet terminam com o refrão melancólico “Hebel, hebel!“. O editor-compilador adiciona este epílogo, ressaltando o valor dos argumentos de Qohélet. O editor resume sua própria perspectiva ortodoxa nos versículos 13 e 144: “Tema a Deus e obedeça aos seus mandamentos, porque isso é o essencial para o homem.”
Como Ler na Prática
Dado o caráter reflexivo e “desconexo” de algumas partes, ler Eclesiastes não é como ler uma narrativa direta. Considere estas dicas:
1. Entenda o Quadro Geral: Comece lendo o Prólogo (1:1-11) e o Epílogo (12:9-14) para captar os temas principais (hebel e o temor do Senhor) e a perspectiva do editor. Isso cria uma moldura para o restante do livro.
2. Foque nos Temas Recorrentes: Ao ler as seções de Qohélet (1:12-12:7), observe os temas que aparecem repetidamente: a busca por prazer, riqueza, trabalho, sabedoria, justiça/injustiça, o tempo (“tudo tem seu tempo”), e a inevitabilidade da morte. Veja como Qohélet avalia a “inutilidade” de cada um “sob o sol”.
3. Leia com a Perspectiva do Editor em Mente: Lembre-se que as reflexões de Qohélet são genuínas sobre a dificuldade de encontrar sentido neste mundo, mas o editor nos direciona para a resposta final: o temor de Deus. As aparentes contradições podem servir para destacar a diferença entre uma vida vivida apenas “sob o sol” e uma vida vivida em temor a Deus.
4. Observe a Natureza Proverbial: Principalmente na segunda parte das palavras de Qohélet (7:1-12:7), muitas observações são concisas e aforísticas, refletindo a sabedoria tradicional, mas frequentemente com o toque de Qohélet.
5. Considere o Contexto Judaico: Embora lide com questões universais, o livro está inserido na tradição de sabedoria judaica. A verdadeira sabedoria, nessa tradição, tem a ver com o temor de Deus.
6. Não Procure Respostas Fáceis: Eclesiastes não oferece soluções simples para as complexidades da vida. Ele confronta a realidade com honestidade, preparando o leitor para buscar o sentido final no relacionamento com Deus, como o editor aponta.
O Lugar de Eclesiastes na História Bíblica
Eclesiastes se encaixa na história bíblica como um lembrete constante da brevidade da vida humana à luz da eternidade. Ele enfatiza nossa necessidade de temer a Deus. Ao mesmo tempo, a fonte sugere que ele “pavimenta o caminho para a revelação maior de nossa garantida ressurreição por meio de Jesus Cristo”. Embora Qohélet lute com a finitude da vida, a perspectiva cristã acrescenta a esperança jubilosa na ressurreição e a certeza do juízo divino, permitindo-nos apreciar ainda mais a forma como Qohélet abraça a vida presente, apesar de sua natureza hebel.
Assim como Tiago no Novo Testamento ecoa a sabedoria judaica e foca na fé prática, Eclesiastes desafia a fé a encontrar significado e sabedoria na realidade do mundo, sempre com o temor do Senhor como fundamento.
Conclusão
Ler Eclesiastes é embarcar em uma jornada intelectual e espiritual. É permitido sentir a angústia das perguntas de Qohélet sobre a “inutilidade” da vida “sob o sol”. Mas o convite final do editor é claro e poderoso: a resposta para a busca por sentido reside em temer a Deus e guardar seus mandamentos. Este livro nos lembra que, em meio à incerteza e transitoriedade da vida, a verdadeira sabedoria e o significado duradouro são encontrados em um relacionamento correto com o Criador, que, no fim, trará tudo a julgamento.
Que sua leitura de Eclesiastes seja um caminho para uma compreensão mais profunda da sabedoria divina aplicada à complexa tapeçaria da vida humana!